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Há dez anos Vai Corinthians
Rafael Castilho

Rafael Castilho é sociólogo, especializado em Política e Relações Internacionais e coordenador do NECO - Núcleo de Estudos do Corinthians. Ele está no Twitter como @Rafael_Castilho.

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Há dez anos Vai Corinthians

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Dez anos do texto que mudou a minha vida

Reprodução / Rafael Castilho

Hoje faz dez anos que minha vida mudou. Pode parecer pretensioso ou exagerado, mas a verdade é que muita coisa aconteceu na minha vida quando publiquei um texto chamado “O porquê do VAI CORINTHIANS!”.

Claro que fico feliz quando as pessoas leem o que escrevo. Quando gostam, fico mais feliz ainda. Mas, posso dizer que nunca escrevo para os outros. Escrevo porque me faz bem. Ajuda a organizar meus pensamentos., lidar melhor com minhas emoções. É uma faxina interna. Tanto é, que quando publiquei esse texto, minha página no Facebook era toda fechada, escrevi apenas poucos amigos. Não podia imaginar o que estaria por vir.

Muitas pessoas me perguntam como me ocorreu, como escrevi aquele texto. Aquilo amadurecia na minha cabeça. Me intrigava, me agitava, mas deixava as ideias repousarem dentro de mim.

Não escrevo todos os dias, pois sou uma fraude. Só consigo escrever quando estou sinceramente tocado por algo. Pode ser uma emoção, uma alegria, uma tristeza, um incômodo, uma inquietação. As vezes acordo na madrugada para escrever. Todas as vezes que escrevi para agradar as pessoas (ou incomodar), ficou tudo muito ruim.

As ideias soltas que repousavam na minha cabeça entraram em ebulição. Quando o Corinthians ganhou o primeiro jogo da semifinal da Copa Libertadores da América me tranquei no quarto. Fechei a porta, apaguei todas as luzes e deitei na minha cama. Fiquei um tempo dormindo, não sei por quanto tempo. Acordei. Meus olhos se abriram de maneira muito súbita. Já não podia dormir, mas tampouco me considerava totalmente acordado. Peguei o tablet que estava ao meu lado e comecei as escrever.

O texto veio todo de uma vez, uma frase depois da outra. Escrevi o “Vai Corinthians” em alguns minutos e com muitas lágrimas. Chorava alto. Meu nariz escorria. Quando reli o que havia escrito não tinha quase nada para mudar nem a corrigir. Eu mesmo não acreditava. Publiquei nas minhas redes. Na época tinha um blog com pouquíssimos acessos.

No dia seguinte acordei assustado. O blog estava explodindo. No meu Facebook as pessoas pediam amizade. Amigos me telefonavam com palavras bonitas.

Tinha uma viagem marcada para a Inglaterra, onde iria concluir a minha pós-graduação. Quando cheguei em Londres minha caixa de e-mails estava lotada. Na época ainda não havia WhatsApp e as chamadas telefônicas eram difíceis e caras. Mas percebi que o texto ainda estava bombando. Aprendi que havia se tornado um “viral”. Não fazia ideia do que era isso. As pessoas compartilhavam o texto por e-mail, faziam powerpoint, usavam as redes sociais, divulgavam meu blog. Algumas pessoas gravavam vídeos interpretando o texto. Recebi convites para o texto virar comercial, virar um filme curto.

Nos caminhos e descaminhos da internet tiraram meu nome e incluíam ao final: “autor desconhecido”. Não me importei. Estava ainda feliz que a mensagem chegava a tanta gente. No mais, sentia um pouco de vergonha e estava assustado com o que ocorria. Não queria parecer “mais corinthiano que os outros”, muito menos que as pessoas pudessem supor que desejava levar alguma vantagem. Me importava bastante com o que os outros iriam dizer ou pensar sobre mim.

Havia escrito o texto apenas para desabafar e enviar para alguns poucos amigos, mas em algumas horas havia se tornado algo incontrolável. Só fiquei meio bolado quando tiraram meu nome e colocaram o do Pedro Bial. Muita gente ainda acredita que o texto é do Bial. Até hoje vem algum amigo sacana que quando me encontra manda um “Fala, Bial”. É engraçado.

Alguns jornalistas famosos publicavam o texto em seus blogs. Amigos queridos enviavam mensagens e corrigiam como podiam quando algum jornalista não dava o crédito corretamente.

Voltei ao Brasil no dia da grande final. Até tinha marcado, meses antes, um passeio de férias depois da minha formatura, mas já não tinha cabeça para mais nada. Cheguei no dia 04 de julho pela manhã. Meus pais enfeitaram toda a casa. Haviam decorado com balões e bandeiras alvinegras. Quando fui ao estádio vi a torcida abrir um mosaico com a frase: VAI CORINTHIANS! O espírito era esse. Tudo parecia mágico.

Esse texto mudou tudo. No meu trabalho portas se abriram. Ganhei uma coleção de livros com a temática de Futebol e Sociedade. Ganhei um grande amor. Ganhei amigos novos. Muitos amigos queridos. As pessoas me receberam com carinho. Alguns desabafavam. Ouvi histórias lindas de gente que ficou tocada ao ler o que escrevi. Cada um tem uma relação diferente com a história. Um leitor me disse que leu o texto para o pai que estava na UTI se despedindo desse mundo e tiveram um último momento de felicidade e congraçamento juntos. Aquilo me tocou demais.

Sim, ganhei também leitores. Não tinha leitores anteriormente e nem acreditava que as pessoas pudessem gostar do que escrevo. Então ganhei confiança em diversas áreas da minha vida. Confiança para escrever, para falar, para trabalhar, para amar.

Não que eu tenha me tornado conhecido, longe disso. Mas pude escrever para mais gente. Hoje tenho minha coluna no Meu Timão, escrevo também para outros veículos e, principalmente, tive a grande alegria de ter contribuído para a criação do Núcleo de Estudos do Corinthians, o NECO.

O texto continua vivo. Vira e mexe encontro ele por aí. Não ligo até hoje quando tiram o meu nome. Só não curto quando mudam o conteúdo, incluindo ou subtraindo frases. Fico com ciúmes. Mas, enfim, não tenho o menor controle sobre isso. Já recebi o texto várias vezes pelo WhatsApp.

Agradeço a Deus, ao universo, à natureza, aos anjos por ter escrito “O porquê do Vai Corinthians”. Agradeço muito a todo mundo que compartilhou, às pessoas que me abraçam carinhosamente. Peço desculpas caso alguma vez não tenha retribuído à altura o carinho recebido. Confesso que fico meio envergonhado e desconcertado. Não sei muito bem como me comportar.

Para quem não leu, esqueceu, ou quer ler de novo o texto, deixo copiado aqui embaixo.

Até mesmo a felicidade o Corinthians me deu!

Aqui é Corinthians!
Vai Corinthians!


O porquê do VAI CORINTHIANS

Vez por outra, algumas pessoas perguntam o porquê do “Vai Corinthians”.

Curiosos, tentam entender porque inevitavelmente exclamamos “Aqui é Corinthians”.

Qual seria o significado destas exaltações?

A mágica de ser corinthiano não se revela somente no ato de torcer pelo Timão dentro das quatro linhas.

O jogo do Corinthians é uma forma de interpretação da realidade. A maneira como celebramos as vitórias ou lamentamos as derrotas é uma representação da vida da nossa gente.
O sofrimento, a superação, a desilusão, o engano, a paixão, a época de vacas gordas, ou as vezes de vacas magras...

A sorte, o revés, a resignação e a euforia.

A plena compreensão de que nada vem fácil na vida da gente.

Nada do que acontece dentro de campo pode fazer sentido sem que haja uma correspondência com a vida social cotidiana.

Mas tal qual aquele ditado em que “a vida imita a arte”, podemos dizer que além do Corinthians jogar o jogo como a gente joga a vida, o contrário também é verdadeiro, ou seja, experimentamos nossa vida reproduzindo a cada momento uma espécie de ética corinthiana.

Uma ideologia que aspiramos nas partidas de futebol, de alguma forma passa a orientar o nosso comportamento.

Tentarei ser um pouco mais claro.

Quando alguém te oferece uma cerveja, mas revela timidamente que vai te servir naquele famoso copo do requeijão, você responde: “Por favor, aqui é Corinthians!”.

Você é chamado para uma entrevista de emprego. Um trabalho que você esperava há tempos. Ao entrar na reunião você murmura quase em silêncio: “Vai Corinthians!”.

Ao ajudar um amigo com a mudança, ou mesmo dar aquela força para carregar cimento e “encher a laje” da casa que o cara está construindo com muito esforço. Se o camarada demonstra gratidão e oferece um abraço, é muito comum chegar no cara e dizer: “ô mano, é nois. Cê ta ligado que Aqui é Corinthians!”.

A mulher da tua vida sorri para você. Olha nos seus olhos e te oferece um beijo. O beijo que você esperou durante dias, semanas, meses ou talvez a vida inteira. Ao voltar para casa você dará socos no ar e vai gritar para a rua inteira escutar “Vai Corinthians!”.

Ano novo. Vamos estourar um Champanhe? Só tem Cidra. Tem problema? Adivinha: “Aqui é Corinthians”.

Bateram no seu carro. Ele estava sem seguro. Você terá de trabalhar meses para arrumar o carango. Bola pra frente. Vai Corinthians!

Quem nunca ouviu essa frase: “Oi filho, seja bem-vindo na minha casa. A casa é simples, mas recebe todo mundo muito bem. Não repara a bagunça”. Inevitável resposta: “Tia, aqui é Corinthians”.

Você foi promovido? Vai Corinthians.

Sua filha se formou na faculdade? Vai Corinthians.

Vai para a balada? Vai Corinthians.

Preserva e admira as coisas mais simples da vida? Aqui é Corinthians.

Identificou-se com este texto? Aqui é Corinthians!

Moral da História: “Vai Corinthians” e “Aqui é Corinthians” são elogios a simplicidade. Demonstram uma satisfação com a própria identidade. Uma afirmação da nossa origem.

O Corinthians é a maior expressão de quem somos. Ele joga no campo reproduzindo nossa realidade.

Alguns acham que temos sorte, fazemos gols no final do jogo, vencemos pelo cansaço.

Outros que jogamos com raça.

Tudo bem. Isso não deixa de ser verdade.

Mas o que conta no final das contas é o seguinte: O Corinthians tem presença de espírito.

Nós somos o Corinthians.

E o Corinthians também está dentro de nós.

Aqui é Corinthians.

Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Meu Timão.

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Rafael Castilho é sociólogo, especializado em Política e Relações Internacionais e coordenador do NECO - Núcleo de Estudos do Corinthians. Ele está no Twitter como @Rafael_Castilho.

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