Arena Corinthians: juiz acata pedido de R$ 40 milhões do MP-SP e clube tenta suspender com recurso
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Por Rodrigo Vessoni
A situação financeira do Corinthians deve ser agravada em mais R$ 40 milhões num futuro próximo. O juiz Randolfo Ferraz de Campos, responsável pela 14ª Vara da Fazenda Pública, aceitou o pedido do Ministério Público de São Paulo para acrescer em 70% o valor de obras e ações sociais a serem realizadas pelo clube na zona leste da capital.
Pelo acordo firmado com o MP-SP em 2011, que garantiria a manutenção da concessão do terreno do estádio, o clube deveria realizar obras e ações sociais no valor de R$ 12 milhões em duas etapas: R$ 4 milhões até seis meses após a Copa de 2014 e os outros R$ 8 milhões em entre janeiro de 2015 e dezembro de 2019.
Ao longo dos últimos anos, o clube alegou ter feito quatro obras e ações sociais - veja mais abaixo. O Ministério Público, por sua vez, nunca aceitou tais alegações e entrou com pedido de um novo valor, com base numa diferença de 106 meses e juros de 1% ao mês, chegando a R$ 39.779.771,75. Esse é o valor exato acatado pelo juiz.
Agora, no início de junho, o Corinthians entrou com recurso para suspender o cumprimento da sentença. Na petição protocolada por um escritório externo que presta serviço ao clube, que o Meu Timão teve acesso, a diretoria faz oito alegações principais para contestar o montante da dívida e também a necessidade de quitação neste exato momento.
As principais alegações do Corinthians:
- Investimento já realizado de R$ 6.161.688,07, sendo a construção de uma EMEI (Escola Municipal de Educação Infantil) e de três CDCs (Clube da Comunidade), além de outras ações sociais;
- Aplicações de multa, juros e encargos por parte do MP-SP deveriam ter sido sobre a diferença do investimento já realizado (R$ 6.161.688,07), e não em cima do valor do acordo inicial (R$ 12 milhões);
- Demora para aprovações legais por parte do próprio Município de São Paulo, que resultou em atraso na execução e finalização das obras;
- Não cumprimento de acordo prévio para uma nova reunião entre as partes que, de forma amigável, poderiam definir novas contrapartidas a serem realizadas;
- Substancial redução nas receitas do clube e da própria Arena Corinthians com o advento da pandemia;
- Medidas tomadas pelo clube para minimizar a falta de receitas (redução salarial de atletas e funcionários, etc);
- Ações sociais que foram realizadas pelo clube desde o início da pandemia, que comprovam o papel social da agremiação;
- Lembrete de que decisões tomadas por MP-SP e judiciário ocorreram quando o Brasil já estava sob efeitos da pandemia (exemplo: acatar novo valor de R$ 40 mi).
Entre essas alegações no recurso do clube, o atual momento de paralisação do futebol brasileiro ganha claro destaque. Um trecho da petição, em forma de apelo, é direto e reto:
"Não é factível ao Corinthians e certamente a nenhum outro clube de futebol, privado de suas fontes de receita, realizar pagamento de quantia certa da ordem de R$ 39.779.771,75 sem comprometer a sua existência como entidade de prática desportiva"
Com base nessas alegações acima, o Corinthians pediu a suspensão do cumprimento da sentença, além de uma nova reunião entre as partes para se buscar um novo acordo.
Esse recurso do clube em segundo grau (agravo de instrumento), porém, não passou da fase de admissibilidade (se deve ou não ser recebido). Então, o recurso retornou ao mesmo juiz de primeiro grau que, por sua vez, pediu uma manifestação por parte de Ministério Público e do Município de São Paulo. Isso ainda não ocorreu.
Em tempo: no período desse imbróglio jurídico, o Corinthians foi presidido por Andrés Sanchez (sete meses de 2011, 2018, 2019 e 2020), Mário Gobbi (2012, 2013 e 2014) e Roberto de Andrade (2015, 2016 e 2017).
Da concessão do terreno por solicitação de Vicente Matheus ao imbróglio jurídico da atual administração
1988
Por meio da Lei 10.622 no mandato de Jânio Quadros - concessão de direito real de uso (CDRU) -, a Prefeitura de São Paulo cede a área de 197 mil m² em Itaquera ao Corinthians, com direito de uso por 90 anos (até setembro de 2078). O clube, por sua vez, se compromete a construir o estádio em até cinco anos;
1993
O prazo de cinco anos termina, mais precisamente no dia 9 de setembro. O estádio não começa nem a ser construído;
2001
Uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) das Áreas Públicas avalia a situação do terreno e pede a devolução. A Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo, então, move ação civil para anular a concessão do terreno, já que o mesmo havia sido transformado pelo clube em CT da base, além de utilizado pela equipe profissional em diversos momentos durante a década de 90;
2002
Processo é extinto a pedido da Justiça.
2005
Tribunal de Justiça de São Paulo anula a sentença e pede que o caso seja reaberto.
2008
Após declarações da Prefeitura e do Corinthians no processo, a Promotoria pede ao juiz Randolfo Ferraz de Campos, da 14ª Vara da Fazenda Pública, que sentencie o clube a devolver a área.
2009
Juiz Randolfo Ferraz de Campos determina novas diligências à administração pública.
2010
O juiz Jayme Martins de Oliveira Neto, da 13ª Vara de Fazenda Pública, cita o Corinthians para que o clube apresente defesa para o pedido do MP sobre a reintegração de posse do terreno por parte da Prefeitura. O clube faz a defesa e o processo prossegue.
2011
Ministério Público, Prefeitura de São Paulo e Corinthians assinam acordo para pôr fim à ação civil movida em 2001 pela Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo. Pelo acordo, o Corinthians se obriga a investir R$ 12 milhões em contrapartidas sociais na região para manter a concessão municipal do terreno.
2012
O Corinthians envia um relatório das contrapartidas sociais para a região. Porém, o promotor José Carlos de Freitas (Habitação e Urbanismo) informa que a lista oferecida não preenche integralmente o perfil das ações fixadas pelo acordo judicial, assinado no ano anterior.
2015
Começa o prazo da segunda etapa (R$ 8 milhões em contrapartidas). A Prefeitura, porém, reclama na Justiça que nem mesmo 25% dos R$ 4 milhões da primeira etapa foram quitados pelo Corinthians. O clube admite atraso de algumas das obras por empecilhos em alguns dos terrenos.
Na sequência, o Corinthians justifica o gasto de R$ 6,1 milhões em contrapartidas, sendo a construção de uma EMEI (Escola Municipal de Educação Infantil) e de três CDCs (Clube da Comunidade), além de outras ações sociais; Prefeitura insiste que os valores investidos eram menores do que o combinado em 2011.
2016
Ministério Público aumenta o valor da segunda etapa (de R$ 8 para 12 milhões). O juiz do caso questiona o andamento da segunda etapa do acordo. Na primeira audiência, o clube garante que apresentaria documentos para mostrar o cronograma dessa etapa.
2017
Justiça notifica o Corinthians em três oportunidades, com o objetivo de esclarecer o andamento das contrapartidas. O clube, por sua vez, não se manifesta em nenhuma delas.
2019
Em maio, o Corinthians é condenado a pagar multa de R$ 800 mil, aplicada por litigância de má-fé. "Friso a postura desidiosa do clube réu que, esquivando-se continuamente de falar, esquiva-se de dar cumprimento àquelas contrapartidas, buscando, muito provavelmente, transtornos e outros empecilhos, postura com a qual não será tolerante este Juízo", declarou o juiz.
Em setembro, o Corinthians impetra um mandado de segurança para tentar suspender multa de R$ 800 mil aplicada pela Justiça. A alegação: segunda parte das contrapartidas ainda não foi definida. Sustenta também que o prazo para a conclusão é dezembro de 2019.
2020
Por meio de uma petição anexada ao processo, a Promotoria de Justiça da Habitação e Urbanismo da Capital informa ao clube e à Prefeitura que o valor do acordo foi de R$ 12 milhões para quase R$ 40 milhões. O juiz do caso acata o pedido e o clube tenta evitar o cumprimento da sentença.
O caso segue na Justiça.