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O complexo de vira-lata e a ausência de manifestações contra o racismo no esporte brasileiro
Mayara Munhoz

Jornalista, 33 anos, mãe do Joaquim. Faço parte do Meu Timão desde fevereiro de 2015. Hoje, sou a editora-chefe dessa loucura toda com muito prazer e amor.

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Coluna da Mayara Munhoz

Opinião de Mayara Munhoz

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O complexo de vira-lata e a ausência de manifestações contra o racismo no esporte brasileiro

Jogadores do Liverpool divulgaram imagem de protesto nas redes sociais nesta segunda-feira

Foto: Reprodução/Twitter

O brasileiro é conhecido por ter o que chamamos de complexo de vira-lata em relação aos outros países. Eu nunca fui muito de achar que tudo lá fora é melhor do que aqui, mas nesses últimos dias vi esse complexo tomar conta de mim. Curiosamente, a expressão foi criada no universo do futebol: o escrito brasileiro Nelson Rodrigues usou o termo para se referir ao trauma sofrido pelo Brasil quando a Seleção perdeu para o Uruguai, no Maracanã, em 50.

Agora ela vem se destacando aqui para mim no universo do futebol e do esporte em geral. Mais precisamente quando se trata dos protestos contra o racismo que tomaram conta do mundo nos últimos dias. Aqui faço uma observação: estou falando apenas de RACISMO, ok? Não quero e nem vou discutir sobre política e sobre lados - sou totalmente a favor de cada um ter o seu direito de ser pró ou contra o que achar mais correto.

Dito isso, voltamos ao racismo. A revolta se intensificou no fim do mês passado quando um policial matou George Floyd, segurança de 46 anos, negro, em Minneapolis, nos Estados Unidos. De lá para cá, as imagens do homem sendo asfixiado tomaram as redes sociais. O sentimento de revolta de brancos e, principalmente, claro, de negros também.

E porque o complexo de vira-lata? Porque não vemos aqui no Brasil uma mobilização pela causa nos jogadores de futebol e nos atletas em geral. Muitas crianças e jovens se inspiram nesses nomes que vestem as cores do país em competições. Muitos são influenciados pelo que eles vivem e dizem. Mas até hoje, segunda-feira, dia 1º de junho, poucos nomes se manifestaram - um deles, aliás, foi o volante Gabriel, do Corinthians, que sempre que possível se posiciona sobre causas importantes.

Quando olhamos lá para fora, principalmente para os Estados Unidos, a realidade é tão diferente. Centenas de jogadores, de diversas modalidades, postaram coisas em suas redes sociais. Mais do que isso. Aliás, MUITO MAIS DO QUE ISSO. Muitos foram para as ruas protestar nos últimos dias. Se colocaram em linhas de frente, manifestaram a sua revolta. Jogadores avaliados em milhares e milhares de dólares, com vidas confortáveis, foram para as ruas brigar pelo que acreditam. Brigar por justiça.

Você pode talvez justificar isso dizendo que George Floyd era americano. Ok, tudo bem. Mas aqui também temos casos frequentes que geram revolta. O mais recente, como todos sabem, é a morte do menino João Pedro, de 14 anos, no Rio de Janeiro. Negro, o jovem levou um tiro de fuzil, pelas costas, dentro da sua casa enquanto brincava.

Ou podemos ressaltar casos de jogadores e atletas de fora dos Estados Unidos que se manifestaram nos últimos dias. Como os jogadores que estão disputando a Bundesliga, na Alemanha, e até mesmo os do Liverpool, na Inglaterra, que ainda nessa segunda-feira fizeram seu protesto por meio de uma imagem divulgada nas redes sociais - imagem escolhida, aliás, para ilustrar essa coluna.

Eu não sou negra. Até tenho familiares negros. Minha bisavó, por exemplo, sofreu vestígios da escravidão no Brasil. Mas, mesmo assim, nunca senti na pele algo que me dê o direito de falar sobre racismo. No entanto, não tem mais como a gente se manter calado. Seja branco, negro, pardo, verde, rosa, azul... não é a cor da minha pele. É o que sinto dentro de mim ao ver a injustiça, o sofrimento e a discriminação.

Eu não sou influente. Apesar de ter o meu espaço aqui, não consigo atingir milhares de pessoas. Tenho poucos seguidores nas redes, não sou uma influenciadora digital. Nesse momento, pela primeira vez na vida, gostaria de ser. Gostaria de ter o poder de levar um pouco dessa revolta para as pessoas. Gostaria de tentar fazer com que todos refletissem mais sobre seus atos, suas falas e o que eles podem fazer para tentar ajudar.

Eu não consigo. Mas sabe quem consegue? Os jogadores e atletas brasileiros. Os nomes tão seguidos, tão adorados e tão compartilhados por aí. Quando um projeto de lei passou a ser discutido para mexer nos direitos dos jogadores de futebol durante a pandemia, eles se juntaram e gravaram um vídeo pedindo por respeito. Porque agora não?

É por esse motivo que nesse momento eu estou me sentindo uma vira-lata brasileira.

#VidasNegrasImportam
#BlackLivesMatter


"Imagina se um grande jogador de futebol, o Neymar, posta toda semana uma dica de livro no Instagram dele. Seria o livro mais lido do mundo. Mas não, ele tem outras prioridades", disse Gustavinho Lima, ex-camisa 10 do basquete corinthiano, em entrevista ao Meu Timão na semana passada.

Veja mais em: Elenco do Corinthians.

Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Meu Timão.

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Por Mayara Munhoz

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