O Corinthians é o time do povo, mas exatamente de que povo?
Opinião de Mayara Munhoz
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"O Corinthians vai ser o time do povo e o povo é quem vai fazer o time". Essa frase de Miguel Battaglia, alfaiate e primeiro presidente do Corinthians, segue a história do clube desde 1910. É motivo de orgulho para os torcedores e se tornou parte da essência do Timão.
Nos últimos tempos, porém, podemos questionar: quem é esse povo exatamente?
Vamos começar pela preços das novas camisas do Corinthians. Já era de conhecimento de todos, há alguns meses, que o clube e a Nike voltariam a vender os uniformes com os preços antigos - aplicados até 2018. A camisa mais barata, a modelo torcedor, passou de R$ 199 para R$ 249; a versão de jogador foi de R$ 299 para R$ 399. Um aumento de 25% no primeiro caso e de 33% no segundo.
O salário mínimo do brasileiro é R$ 1.045. No ano passado, o valor era de R$ 998. Um aumento de 4,7% no ganho do trabalhador comum. Aliás, se formos mais além: o corinthiano que ganha um salário mínimo usará 23% dele para comprar a camisa mais barata; e 38% para adquirir a mais cara.
Em meio a uma pandemia, com cortes de salário e demissões em grande quantidade.
Depois, podemos citar também a ação divulgada pelo Banco BMG na noite desta segunda-feira. Desde o lançamento da nova camisa, no domingo, a Fiel tem pedido nas redes sociais que o banco faça uma adaptação em seu logo e o deixe preto e branco na camisa do Timão. A expectativa foi levemente frustada quando a ação que poderá resultar nisso foi divulgada pelo banco.
A camisa do Corinthians pode sim ter o logo preto e branco. Desde que 50 mil novas contas sejam abertas no Meu Corinthians BMG. Eu entendo que uma marca precisa sim pensar no seus benefícios, no seu lucro, no que é melhor para ela. É normal!
Mas não custaria nada ao BMG deixar o logo com a cara do Corinthians na camisa. Isso, inclusive, já foi feito em uma ação ano passado. É importante dizer que abrir uma conta é totalmente gratuito, ou seja, sem custos ao torcedor. O BMG foi ainda mais além e vai dar R$ 10 para quem abrir a conta e um desconto de R$ 25 na compra da nova camisa - na loja da Arena.
Mas, ao meu ver, faltou um sensibilidade com o torcedor. Faltou uma ação pensada exclusivamente para o povo.
Por fim, o torcedor do "Time do Povo" gasta bastante para ver o "Time do Povo". Antes da paralisação por conta do coronavírus, os valores dos ingressos da Arena Corinthians seguiam - como há anos - bem caros para o corinthiano. Vamos a alguns exemplos:
Se você quisesse acompanhar um clássico, pelo Paulistão, no estádio, o mínimo que gastaria era R$ 74 reais por pessoa, na Leste Superior. Um lugar mais perto do gramado, como a Leste Inferior Central, custaria R$ 110. O lado Oeste, então, os preços variam entre R$ 120 e R$ 350. Se a opção fosse por um jogo de menor importância, também do Paulistão, o mínimo seria R$ 54. O lugar mais caro R$ 90.
Vou exemplificar uma situação para vocês. Eu tenho um tio, muito querido, que tem seus 70 anos. Corinthiano DOENTE. Daqueles malucos mesmo. Mas nunca foi na Arena Corinthians. É o seu sonho ir. Eu já prometi que vou levar ele. Ele tem uma certa dificuldade de locomoção, então, eu não poderia levá-lo sozinha ao estádio. Precisaria de pelo menos mais uma pessoa para me ajudar. O sonho dele? Ver um Corinthians e Palmeiras na casa dos sonhos.
Quanto eu gastaria, então, em um lugar mais barato nessa situação? R$ 222. Isso, claro, sem contar gasto com estacionamento perto da Arena. Se eu quisesse levar ele em um lugar mais confortável, justamente por conta da dificuldade dele, o gasto seria em torno de R$ 360.
Você acha mesmo que o brasileiro comum, o corinthiano comum, pode pagar isso para ver um jogo? Pode se desprender facilmente de R$ 100, R$ 150 reais para ir no estádio um dia? Se quiser levar a família, então, esquece.
E já que falamos de sensibilidade ali em cima, vou aproveitar para citar que os torcedores que compraram os ingressos dos jogos contra Ituano e Palmeiras não receberam reembolso do Corinthians. Receberam créditos que poderão ser usados vai lá saber quando que essa pandemia permitirá torcida de volta em estádios.
De novo: tudo isso em meio a uma pandemia, com cortes de salário e demissões em grande quantidade.
Os cinco operários que fundaram o Sport Club Corinthians Paulista lá em 1º de setembro de 1910 não conseguiriam, hoje, comprar uma camisa do clube facilmente e nem acompanhar os jogos.
O povo que ama de graça o seu clube do coração precisa pagar, e caro, para consumir o Corinthians.
O Corinthians é o time do povo, mas exatamente de que povo?
Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Meu Timão.
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