O NÃO de Renato
Opinião de Rafael Castilho
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A não contratação do Renato em si, pouco me importa. Renato sequer era o meu nome preferido para ocupar o cargo de treinador do Corinthians nesse momento.
Não porque Renato não tenha tido sucesso em sua passagem recente pelo Grêmio. Foi um período longo para os padrões brasileiros, com relativo sucesso.
Mas o corinthiano sabe muito bem. Nem tudo que é bom para os outros é bom para o Corinthians. Aqui a realidade é outra. Tanto que quando contratamos um novo jogador ou um novo técnico, de imediato perguntamos uns aos outros: “Tem cara de Corinthians”? Em seguida avaliamos sua capacidade técnica, condição física, retrospecto, entre outros quesitos.
Renato talvez pudesse ter algum sucesso no Corinthians, mas num momento menos caótico de nossa história.
Desde seu tempo de jogador, percebe-se que Renato é uma pessoa vaidosa. Não que isso seja um problema em si mesmo, mas Renato, mesmo depois em sua carreira como técnico, gosta de ser cortejado e adulado.
Passado esse frenesi – que particularmente me pareceu patético, por certa parte da torcida – a realidade do dia-a-dia de Renato não permitiria que ele fosse paparicado, como aparentemente gosta de ser. Aqui o bagulho é louco. Não sei como ele reagiria em situações de extrema crise. Se alegaria estar sendo muito pressionado, pegaria o chapéu e iria embora. Ou se ficaria ameaçando se desligar a cada cobrança mais efusiva, que queiramos ou não, são recorrentes na história do Corinthians.
Pois bem, Renato não veio, é vida que segue, deixemos de falar especificamente dele e vamos nos concentrar no que compete ao Corinthians.
O Corinthians construiu um problema maior do que já tinha. A missão atual seria contratar um técnico com capacidade de liderar um elenco limitado num período de extrema dificuldades e recolocar o Corinthians no caminho das vitórias.
Mas o processo foi conduzido de maneira desastrosa, a meu ver. Pelo menos no que tange a reputação e o que hoje chamam de “marca” do Corinthians.
Primeiro problema foi essa tola comoção nas redes sociais. Embora Renato seja um técnico de sucesso recente (digo isso porque não teve antes sucesso parecido em suas passagens pelos clubes brasileiros), não tem história nenhuma ligada ao Corinthians. Não seria a vinda de um novo ídolo para jogar no ataque do Coringão.
Pouquíssimos jogadores teriam uma chegada tão celebrada. Nossa torcida quase nunca grita o nome dos jogadores. Tomamos cuidado demais com isso. Até mesmo injustiças históricas foram cometidas pelo não reconhecimento de certos jogadores que defenderam com grande virtude nossa camisa.
Sei que isso é difícil controlar. Principalmente nessa era de redes sociais. As coisas tomam um contorno gigantesco e ninguém controla.
Mas a diretoria do Corinthians poderia sim se manifestar. Tirar um pouco o foco. Não passar essa mensagem de que sequer teríamos um plano B, estaríamos apenas esperando o SIM de Renato.
Alguns acreditam que o NÂO de Renato não tem efeito algum. Embora, como eu disse, não sou nenhum fã do Renato, esse tipo de situação fragiliza sim a instituição. Se o SIM do Ronaldo em 2008 elevou o patamar do Corinthians, com reflexo na maneira como ele passou a ser visto pelo “mercado” do futebol, jogadores, técnicos, esse NÂO do Renato, pode não ser um desastre, até porque as duas figuras não são equivalentes, mas é mais um componente, entre tantos, para arranhar a imagem do Corinthians nos últimos tempos. Estamos fartos!
Dois aspectos são principais.
1 - O “Mercado da Bola” – Renato pediu mais tempo com a família. Provavelmente o tempo necessário para que seja convidado pelo Flamengo, por exemplo. Tudo bem, ninguém tem nada com isso. Problema do Flamengo e do Renato. Mas não deixa de ser alarmante a distância que temos hoje, em termos de competitividade econômica no futebol. Se o Flamengo, que passou décadas em crise financeira, agora se tornou um novo rico, tudo bem. Porém nada deveria justificar uma distância tão grande em termos de receitas e resultados financeiros entre o Corinthians e o Flamengo (ou aquele time verde). Isso só ocorre porque temos sérios problemas de gestão e fomos perdendo nos últimos anos protagonismo no futebol brasileiro.
2 - Condução da “contratação” de Renato - Meu Deus! Seria tão difícil conduzir as coisas de outra forma? Não poderiam driblar essa situação. Olhar para um lado e jogar para outro? Não poderíamos dizer aos meios de comunicação que estamos atrás de outros técnicos enquanto rolasse uma negociação sigilosa (ou menos pública) com Renato? Claro que sim! Já tivemos outras grandes contratações desse tipo. Uma frase “nova”: “O segredo é a alma do negócio”.
Foi assim que trouxemos o Ronaldo, driblando o Flamengo. Foi assim que o Neto veio no meio de uma negociação que aparentemente seria irrelevante. Já pensou se tivesse uma campanha da torcida na época pedindo o Neto. Será que o Palmeiras iria facilitar a negociação? E quando o Sócrates foi contratado. O Corinthians iludiu o São Paulo, oferecendo dinheiro para comprar um jogador – dinheiro que o SPFC já tinha reservado para comprar o Sócrates. Enquanto Isidoro Matheus foi ao Morumbi comprar o Chicão, seu irmão Vicente Matheus foi a Ribeirão Preto e voltou com o maior jogador de nossa história.
O sigilo na negociação garantiria a vinda do Renato? Provavelmente não. Mas isso evitaria que a prospecção de um novo técnico se transformasse num caso tão constrangedor. Sequer ouvi a voz do presidente nesse processo e as coisas tomaram um contorno gigantesco.
No futebol, como em qualquer outro mercado, todo mundo se fala. Essa barrigada tira mais um talho da nossa credibilidade tão arranhada. Esperamos que diante de toda essa dificuldade possamos trazer um técnico capaz de restaurar o Corinthians e dar algum padrão de jogo.
Uma lição fica desse episódio. A torcida do Corinthians está extremamente carente. Não creio que seja somente carente de títulos. Mas de um time competitivo, com a nossa cara. Carente de jogar de igual para igual. De se ver em campo na maneira como o Corinthians joga. De se reconhecer no Corinthians e ter o Corinthians dentro de si.
E, é evidente, uma saudade imensa de ir ao estádio, soltar a voz, extravasar o amor pelo Corinthians. Nunca ficamos tanto tempo longe. Quem tem o Corinthians em frente aos olhos, ao alcance de sua voz, não precisa de nenhuma hashtag.
Tomara que isso tudo passe logo. Saudades, Corinthians.
Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Meu Timão.