Fiel mimada?
Opinião de Rafael Castilho
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Creio que essa coluna baterá todos os recordes de xingamento. Mas isso não é novidade no Fórum do Meu Timão.
Este site que já faz parte da história do Sport Club Corinthians Paulista, tem realizado coisas incríveis nos últimos anos e se tornou algo que já faz parte da rotina e do cotidiano do fiel torcedor.
O site tem jornalistas importantes, colunistas muito bons e também leitores maravilhosos, felizmente a maioria.
Mas tem também uns, viu? Só por Deus. Dá pra perder a fé na humanidade. Alguns até dizem que seria melhor restringir os fóruns de comentários. Eu sou contra. Primeiro pelo apego que tenho pela liberdade e pela democracia. Segundo porque alguns comentários são reveladores.
Quem pensa para além das notícias do dia-a-dia, se preocupa e reflete muito sobre o futuro do Corinthians. E a visão de mundo de certa parte de nossa torcida contrasta com nossa história de humildade, combatividade, perseverança, abnegação, amor e fé.
Vejam vocês, vou abordar aqui duas situações bem recentes. A do Sylvinho e do Gabriel. Sylvinho foi demitido essa semana e Gabriel está com sua ida selada para o Internacional de Porto Alegre.
Realmente, os dois não trouxeram os resultados que se esperava. Não estou aqui dizendo que o técnico e o jogador deveriam permanecer, mesmo produzindo abaixo do desejável, cada um em sua função. Exigência é normal em qualquer área de atuação e quase sempre somos medidos por nossos resultados.
Mas gostaria de provocar um pouco de reflexão de como parte da torcida se comportou com ambos.
Comecemos por Sylvinho. Cria do terrão, foi um jogador muito importante em nossa história. Em 1995 foi uma grandiosa revelação e, muito jovem, demonstrou grande preparo, inteligência, capacidade e garra.
Talvez, os mais jovens não entendam as circunstâncias daquele ano de 1995. O Corinthians estava há cinco anos sem títulos. Há sete anos sem ganhar um Campeonato Paulista. Pior, em jogos para lá de suspeitos, nos anos Parmalat, perdemos as finais do Paulista de 1993 e do brasileiro de 1994 para o Palmeiras. No bojo desse grande patrocínio, que naqueles anos se chamava de “cogestão”, o clube rival vivia dias de felicidade. Nós de tristeza. Como é do feitio do Corinthians, não nos dobramos. Impusemos resistência enfrentando dificuldades incríveis, seja em termos de elenco, de aporte financeiro e de “bastidores”, se é que vocês me entendem.
Sylvinho subiu com uma geração de garotos da base muito boa e superamos os rivais finalmente, em dois jogos incríveis. Foram jogos históricos. Ganhamos também nossa primeira Copa do Brasil, derrotando o Grêmio do já emergente Felipão lá no Estádio Olímpico, numa verdadeira guerra em campo. Sylvinho ganhou também outros dois Campeonatos Paulistas em 1997 e 1999, além daquele também histórico Campeonato Brasileiro de 1998.
Eu sei o que vocês estão pensando. Ele ter sido um grande jogador não quer necessariamente dizer que será (ou que é) um bom técnico. Tudo bem, concordo com vocês.
Sei também que vocês estão pensando. Ora, o time estava jogando muito mal. Não tinha nenhum esquema, mexia mal, escalava errado. Tá bom, eu também tenho ficado puto durante os jogos.
Mas a verdade é que o tratamento para com o Sylvinho foi repugnante, injusto, exagerado, violento e, em alguns casos, até cafajeste. Se fosse só xingar de burro... nenhum técnico está livre disso. Ocorre que ele não merecia esse tratamento desproporcional.
Quanto ao Gabriel, de imediato já vejo uma incoerência.
Se o Sylvinho era tão ruim e estava comprometendo o desempenho do time, não seria melhor reavaliar o atleta?
Ora, quando um time está desajustado isso compromete a organização tática, o posicionamento, o preparo físico e, claro, o desempenho dos jogadores. Num time organizado é muito mais provável que um jogador desempenhe melhor o seu papel em campo.
Tanto Sylvinho como Gabriel sempre se declararam corinthianos.
Ah, isso não é mais tão importante nos dias de hoje? No caso do Gabriel, para além de se dizer corinthiano, sempre demonstrou grande empenho, raça e dedicação. Creio que isso até comprometeu seu futebol, pois muitas vezes demonstrou até uma espécie de afobamento.
Também nesse caso, creio que seja possível fazer uma avaliação e se chegar à conclusão que o melhor é negociar o Gabriel e agradecer pelos serviços prestados. Tudo bem, isso é do futebol.
Mas precisavam massacrar o jogador por conta do desempenho no ano passado? Pergunto: qual jogador foi bem pra caramba no ano passado?
Antes do ano passado Gabriel já tinha vencido o incrível Campeonato Brasileiro de 2017. Também foi tricampeão paulista, sabem o que é isso? O Corinthians não vencia um tri campeonato paulista há quase oitenta anos. Eu nunca tinha visto, meu pai nunca tinha visto.
Mas eu sei que pra uma galerinha aí, Campeonato Paulista não vale mais nada. Virou Paulistinha. Que coisa, já fomos mais humildes. Se a gente perde a capacidade de enxergar numa perspectiva histórica estamos perdidos. O Corinthians não nasceu depois do Ronaldo.
Creio que a torcida do Corinthians deve recuperar sua humildade. Nunca fomos arrogantes desse jeito.
Quer me deixar furioso, é quando alguém compara o Corinthians com o Flamengo. Mando logo para aquele lugar. Primeiro porque não somos (ou gosto de acreditar que não somos) arrogantes daquele jeito. Segundo – e disso sim não tenho dúvida alguma – a Fiel é foda e não cumpriríamos aquele papel ridículo que o Flamengo cumpriu se apequenando frente ao Palmeiras. Que merda foi aquilo.
Difícil dizer isso, mas existe uma sãopaulinização em parte – felizmente pequena – da nossa torcida. Isso não pode ocorrer. Um dia falo mais sobre isso.
Mas o que salva e que salvará o Corinthians é o nosso corinthianismo.
Enquanto mantivermos dentro de nós o sonho dos nossos antepassados que construíram esse clube para representar aquilo que a gente é na vida da gente, para superar aqueles que sempre nos diminuem, para ser o clube que dá vez e voz ao nosso povo, permaneceremos como o clube mais incrível, mágico e original do Planeta Terra.
Não queremos ser o Manchester City, o PSG, o Real Madrid, nem nenhum outro. Queremos ser o Coringão do nosso coração!
Um Corinthians que jogue o jogo como a gente vive a vida.
Sejamos mais humildes e generosos. Todas as vezes que nos tornamos arrogantes em nossa história deu em merda.
É maravilhoso ser corinthiano do jeito que a gente é, do jeito que a gente sempre foi. Não esqueçamos de quem nós somos, nem de onde viemos.
Vai Corinthians!
Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Meu Timão.